Uma condição até então mais associada a pessoas mais velhas está se tornando cada vez mais comum entre os jovens adultos: a síndrome do olho seco – um problema oftalmológico crônico que ocorre quando os olhos não produzem lágrimas suficientes ou quando as lágrimas têm qualidade inadequada para manter a superfície ocular bem lubrificada.
Um novo estudo conduzido por pesquisadores da Aston University, no Reino Unido, revelou que 90% dos participantes com idades entre 18 e 25 anos apresentavam ao menos um sinal clínico da doença, o que chamou a atenção dos cientistas. Isso porque existem vários fatores de risco para a síndrome do olho seco, incluindo estresse e uso de lentes de contato. Mas, esses resultados em adultos jovens evidenciam um problema crescente que já está sendo chamado por especialistas de “epidemia comportamental”, especialmente pelo excesso de uso de telas. Os resultados foram publicados no The Ocular Surface.
Segundo a oftalmologista Claudia de Paula Faria, do Hospital Israelita Albert Einstein, na síndrome do olho seco (ou doença do olho seco), a qualidade das lágrimas é comprometida, com consequente baixa concentração de lipídios ou mucina. Isso resulta em uma película lacrimal instável, que evapora rapidamente, levando a sintomas como sensação de areia nos olhos, ardência, vermelhidão, visão embaçada e sensibilidade à luz.
“Essa é uma condição comum e complexa, que afeta a capacidade dos olhos de se manterem adequadamente lubrificados. É uma doença multifatorial que causa desconforto, problemas visuais e inflamação da superfície ocular. A condição pode impactar significativamente a qualidade de vida e é cada vez mais prevalente em todo o mundo”, disse Faria, ao ressaltar que a condição se diferencia do ressecamento ocular ocasional quando se torna um problema crônico, geralmente mais grave, com sintomas persistentes, causando importante inflamação e possíveis danos à superfície do olho.
O impacto das telas nos olhos
Para alcançar os resultados, os pesquisadores acompanharam, durante um ano, um grupo de 50 jovens adultos. Ao final do período, constataram que 56% dos participantes já apresentavam o diagnóstico de síndrome do olho seco, enquanto 90% tinham pelo menos um sintoma relacionado à condição.
Ao longo do ano de acompanhamento, os pesquisadores também observaram uma progressão significativa da doença em muitos dos participantes. Um dos principais fatores associados à piora foi o tempo diário de exposição às telas – em média, os jovens passavam cerca de oito horas por dia em frente a dispositivos digitais. Esse hábito influencia diretamente o padrão de piscadas (que se tornam menos frequentes e incompletas), dificultando a distribuição uniforme da lágrima sobre a superfície do olho e facilitando sua evaporação, o que intensifica o ressecamento ocular.
“O uso prolongado de telas digitais está fortemente relacionado ao surgimento e à piora da síndrome do olho seco”, explica Faria. “O tempo excessivo diante das telas altera o comportamento de piscar e desestabiliza o filme lacrimal, aumentando o risco e a intensidade dos sintomas. Piscar menos e de forma incompleta impede a lubrificação adequada da superfície ocular, tornando os olhos mais suscetíveis ao ressecamento e à irritação.” Mesmo uma exposição considerada moderada (entre duas e seis horas por dia) já está associada a taxas mais elevadas de sintomas da doença em comparação com quem passa menos tempo diante das telas.
Detecção precoce
O estudo também ressalta a importância da detecção precoce. Isso permite identificar indivíduos que, mesmo sem sintomas evidentes, já apresentam alterações nos olhos e podem desenvolver a doença de forma mais severa no futuro. Muitos casos evoluem de forma silenciosa e só são diagnosticados quando os sintomas se tornam limitantes, prejudicando atividades cotidianas e a qualidade de vida.
Além dos fatores comportamentais, a síndrome do olho seco tem causas multifatoriais. Está associada ao sexo feminino, idade avançada, uso de lentes de contato, cirurgias oculares, doenças autoimunes, uso de medicamentos como antidepressivos e anti-histamínicos, além de condições ambientais como poluição e ar seco.
O distúrbio também pode afetar crianças e adolescentes, especialmente aqueles expostos precocemente e por longos períodos às telas. Por isso, medidas preventivas, como limitar o uso de tela ao tempo máximo de três horas por dia; incentivar a realização de atividades ao ar livre e exercícios físicos; usar a regra “20-20-20” (a cada 20 minutos diante da tela, olhar para algo a 6 metros de distância por 20 segundos); educar crianças e pais sobre a importância de piscar corretamente durante o uso de telas e realizar consultas oftalmológicas anuais de rotina são fortemente recomendadas.
Atualmente, não existe cura definitiva para a síndrome do olho seco. Os tratamentos disponíveis buscam controlar os sintomas e evitar o agravamento da condição, com uso de lágrimas artificiais, colírios anti-inflamatórios, suplementos alimentares, além de abordagens personalizadas conforme o caso de cada paciente. A oftalmologista do Einstein reforça que a adaptação do estilo de vida é fundamental para frear a progressão da doença, que exige acompanhamento contínuo e tratamento a longo prazo.
“A síndrome é uma condição crônica que requer estratégias de tratamento personalizadas e de longo prazo, adaptadas aos mecanismos específicos da doença e às flutuações dos sintomas de cada paciente. O alívio completo e permanente é raro. A maioria dos pacientes precisa ajustar os tratamentos ao longo do tempo e pode necessitar de múltiplas terapias para controlar os sintomas de forma eficaz”, concluiu.
Por Fernanda Bassette/Agência Einstein
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