Venezuelanos refugiados no Grande Recife lamentam falta de trabalho e violência na fronteira brasileira

Parentes de Evelin Cabrera (ao centro) estudam em escola pública no Grande Recife (Foto: Pedro Alves/G1)

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Pouco mais de dois meses após chegarem a Pernambuco em uma ação humanitária, os 69 venezuelanos trazidos de Roraima a Igarassu, no Grande Recife, lamentaram a onda de violência em Pacaraima (RR), cidade que faz fronteira com a Venezuela.

A violência se acirrou no último sábado (18) quando um grupo de brasileiros atacou acampamentos de venezuelanos, colocando fogo em objetos, roupas e documentos dos imigrantes após um comerciante ser assaltado e agredido – ele diz que foram venezuelanos que praticaram o roubo. Após a onda de violência, 1,2 mil venezuelanos deixaram o Brasil, segundo o Exército.

“Nunca passei por situações de violência, mas conheço irmãos que foram muito humilhados. Atropelaram meu genro e sequer prestaram socorro. Conheço um homem que teve uma arma apontada por um morador de Boa Vista. Lá, não se tem leis para venezuelanos”, conta a venezuelana Evelin Cabrera, de 37 anos.

A apreensão também tomou conta de venezuelanos que estão no Distrito Federal. “Me doeu bastante ver a saída dos venezuelanos, porque há muitas pessoas boas que vieram para trabalhar, mas há também os maus”, disse um deles, que pediu para não ser identificado.

Venezuelanos que estão na Paraíba reforçam que estão no Brasil “para trabalhar” e pedem que os brasileiros “acolham os irmãos com o coração.”

“A gente não veio pra cá para ser milionário. Viemos para trabalhar, manter a família e viver dignamente, como qualquer pessoa merece na vida. Não queremos incomodar ninguém. Por isso eu peço que a fronteira não seja fechada, peço que os brasileiros acolham os meus irmãos com o coração”, diz o venezuelano Yoel Vera, de 44 anos.

Venezuelanos em PE

Morando no Grande Recife, Milena Milagros Salazar se preocupa com familiares na Venezuela (Foto: Pedro Alves/G1)Morando no Grande Recife, Milena Milagros Salazar se preocupa com familiares na Venezuela (Foto: Pedro Alves/G1)

Morando no Grande Recife, Milena Milagros Salazar se preocupa com familiares na Venezuela (Foto: Pedro Alves/G1)

A falta de trabalho é uma das reclamações de quase todos os venezuelanos que se refugiaram em Igarassu. Apenas três dos 39 adultos conseguiram empregos formais.

Com mão de obra disponível, faltam oportunidades em meio à crise econômica no Brasil. No caso dos venezuelanos, ainda há a barreira do idioma e a falta de documentos.

Milena Milagros Salazar, de 28 anos, saiu de Ciudad Bolívar em março com o marido e cinco filhos. Hoje ela vive com a família em uma casa mantida por uma ONG, mas sonha em ter um emprego fixo para poder arcar com uma moradia própria.

Ela fala que encontrou na venda de alimentos uma tentativa de complementar a renda enquanto o emprego formal não aparece.

“Vendemos bolos e picolés. Estou gostando daqui, porque as pessoas são simpáticas. Lá, meus cinco filhos comiam uma vez por dia, estavam fracos. Me sinto mal ao ver toda a onda de violência em Pacaraima. São todos famílias. A minha, inclusive, continua na Venezuela, fui a única que saiu. E se, para eles, ficar insustentável?”, lamentou Milena.

Morando em Igarassu, no Grande Recife, Evelin Cabrera tem 60 familiares venezuelanos que se refugiaram no Brasil (Foto: Pedro Alves/G1)Morando em Igarassu, no Grande Recife, Evelin Cabrera tem 60 familiares venezuelanos que se refugiaram no Brasil (Foto: Pedro Alves/G1)

Morando em Igarassu, no Grande Recife, Evelin Cabrera tem 60 familiares venezuelanos que se refugiaram no Brasil (Foto: Pedro Alves/G1)

Já Evelin fala que tinha uma vida ocupada na Venezuela, mas no Brasil ainda não conseguiu uma colocação. Ela conta que migrou para o Brasil ao lado de outras 60 pessoas da família. No entanto, eles não estão todos juntos: parte está em outros estados e parte continua em Roraima, no acampamento da Organização das Nações Unidas (ONU), em Boa Vista.

“Já trabalhei em um supermercado, outra vez como cozinheira, já fiz de tudo, mas nunca parei de trabalhar, exceto agora. Na Venezuela, a crise estava forte demais. Não tínhamos comida, remédio, trabalho, nada. Se tínhamos o que comer num dia, não sabíamos se também teríamos no outro”, explicou.

Quando lembra do centro onde foi acolhida em RR, Evelin lamenta a quantidade de pessoas que precisam ser atendidas ao mesmo tempo pela organização. Antes disso, sua família precisou dormir na rua por um tempo, até ir para um abrigo das Nações Unidas, onde permaneceu por oito meses.

“Depois, essa ajuda se enfraqueceu. Vivemos em vários abrigos desde então, mas estávamos muito vulneráveis e dormíamos no chão, em barracas. Minha irmã está em Roraima e é muito difícil. Aqui, vamos à escola, temos privacidade, um banheiro pessoal. Isso não é o mesmo que dividir tudo com 520 pessoas. Aqui, somos tratados como ser humanos que somos”, disse Evelin.

‘Abraçando a Venezuela’

Estudantes brasileiros acolheram venezuelanos em escola de Igarassu, no Grande Recife (Foto: Pedro Alves/G1)Estudantes brasileiros acolheram venezuelanos em escola de Igarassu, no Grande Recife (Foto: Pedro Alves/G1)

Estudantes brasileiros acolheram venezuelanos em escola de Igarassu, no Grande Recife (Foto: Pedro Alves/G1)

Dos imigrantes em Igarassu, 35 crianças estão estudando em escolas de ensino fundamental e outros 15 adolescentes e adultos na Escola Estadual Santos Cosme e Damião.

Na última quinta-feira (23), eles receberam doações de estudantes que promoveram a ação “Abraçando a Venezuela”.

“A gente quer essa amizade. A gente tem que abraçá-los do jeito que der. A ideia é mostrar nosso carinho e afeto, porque é tão bom ajudar a quem precisa”, explicou o estudante Johnny Rodrigues, um dos idealizadores da ação.

A ideia foi posta em prática com a ajuda da professora de português e sociologia dos venezuelanos, Albanita Rodrigues. Com 33 anos de sala de aula, ela tenta integrar a comunidade escolar aos imigrantes. Os 15 venezuelanos estudam na referida escola com a ajuda de um intérprete.

Fonte: G1

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